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terça-feira, 23 de novembro de 2010

benzedura

Os homens,
machos maduros de vez,
estendiam suas redes de tábuas sobre as águas grossas do mar,
e, no entanto,
não descansavam em paz:

damas linguarudas saltavam como ondas de ressaca
por todos os lados
e lambuzam-lhes as caras de pau
com suas línguas benzedeiras.

E, quando enfim, os bravos retornavam à terra firme,
cruelmente gripados,
porém bentos,
não se lembravam de absolutamente nada.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

antropólogo


Subiu às elevações de uma madrugada azulada
na esperança de desvendar cada uma das insinuações
vindas das criaturas do sereno.

As palavras se assanhavam no salivar fermentado dos bichos
e gotejavam incompreensíveis na similitude dos gestos.

Nesse meio tempo, simplesmente sorria a podridão da noite
e vislumbrava cada gole dos presentes
com a satisfação de um ser fodidamente destilado
no apuro de suas observações.

domingo, 7 de novembro de 2010

milênios

Aos deuses mais cruéis
juventude eterna
eles nos dão de beber na mesma taça 
o vinho, o sangue e o esperma

Paulo Leminski

(...) ouçam todas essas canções.
Falam dos deuses,
da bravura de suas palavras
e do hálito de vinho,
e não de suas cáries ou do ranço
no despertar das moléstias.

E não pensem que eles não são enfermos
em sua humanidade.
Conhecem sim o ódio e a maldição,
bem como o cheiro da luxúria.

afinal de contas são realmente deuses,
e sabem do pouco que nos resta um tudo.

eletricistas

Lá pelas tantas da tarde,
as entranhas explodiam das crenças
num rasgo profundo de luz.

No exato momento do esquecimento da morte,
essa que vem de dentro,
e da vociferação intensa do Sol.

Eles não sabiam nada sobre as horas
e elas....
trepavam nos postes da rua.